sexta-feira, 22 de novembro de 2002

Admirável Corpo Novo

Como toda mulher bonita que eu já conheci, minha namorada se acha gorda. Não entendo essa obstinação das mulheres em ser absurdamente magras. Massérrimas, se possível, anoréxicas. O mais curioso é que a maioria das que se acham gordas, não o são. Talvez alguma excessão possa estar ligeiramente acima do peso.

Aliás, o que é estar acima do peso? Um grupo de cientistas malucos inventou uma fórmula matemática que deveria indicar quem está ou não na "normalidade". Que expressão horrível, essa tal de normalidade. Se Edison vivesse no século XX, tomaria comprimidos para dormir, para ter oito horas de sono, como qualquer pessoa normal. Ele só dormia três e, graças a isso, hoje temos a luz elétrica.

Então, tecido adiposo e beleza são termos antagônicos? Nada mais ignóbil! Conheci muita gente bonita e gorda, muita gente bonita e magra. Aliás, também conheci muita gente feia e gorda e eu, do meu lado, sou magrelo e não sou nada que se diga agradável de se ver. Mas quem tem 60kg distribuídos em 1,70m pode se considerar na faixa padrão de beleza, porque é normal. Será que isso faz algum sentido?

A lógica de que peso e altura devem ser relativos é cruel. Quem não faz parte desse grupo é estranho, é menor. O curioso é que essa é uma crueldade subliminar. Tão discreta que mesmo os passivos dessa crueldade não a percebem. Aceitam, com resignação. É como se obedecessem cegamente a um comando, sem contestar. Isso faz pensar naquelas histórias de Admirável Mundo Novo e 1984. Uma crueldade que todos aceitam.

Essa ditadura da estética precisa de um fim. Em ambos os sentidos. Seria ótimo se tivesse uma finalidade, ao menos. Caso contrário, basta que tenha termo.

terça-feira, 19 de novembro de 2002

::~IMPOTÊNCIA~::

Nós, homens, odiamos essa palavra. Tudo que é relativo a essa palavra. Odiamos pensar nela, odiamos a grafia dela, não importa em que fonte. Odiamos até o simples som dessa palavra. Tememos seus efeitos, suas repercussões. Mas mais do que temer, odiamos, mesmo. Em todos os seus aspectos, em todas as línguas, todos os parâmetros. E existem vários aspectos para impotência. Impotência é um bocado de coisa.

Impotência é silêncio. É caminhar por horas de mãos dadas com alguém sem dizer palavra. Aquela mudeza constrangedora de quem não sabe o que dizer para aliviar a apreensão de alguém. É não ter o que dizer, sabendo que precisa dizer alguma coisa. Esperar que apenas um abraço resolva e saber que não. Esse tipo de impotência é desgastante, preocupante, alucinante. Não saber ser o que dizer diante da aflição alheia é pior do que a própria aflição.

Impotência é ansiedade. É esperar e saber que nada vai acontecer. Ou, por outro lado, que aquilo que não podia acontecer, vai acontecer. Ficar contando o tempo, fingir que não se preocupa. Fechar os olhos, para não ver acontecer. Tapar os ouvidos, para não ouvir que não aconteceu. É observar sem contemplar. É amargar os momentos. Sentir todos eles, um por um, passando por entre os dedos.

Impotência é descompasso. É esquecer absolutamente o sentido da palavra serenidade. É querer ter o que se espera no momento em que se quer. É não saber mais esperar.

Pouca coisa pode ser tão odiosa quanto a impotência. Pouca coisa pode ser tão odiosa sob aspectos tão distintos. Ainda assim, ela é inevitável. Em um momento ou outro, por uma, ou outra razão, todos estaremos impotentes. Até mesmo aceitar esse fato com conformidade é sinal de impotência.

Hoje calibrei os pneus da bicicleta do meu irmão. Aproveitei para gastá-los.

Pouca coisa é tão boa para fazer pensar quanto pedalar.